O Espelho – Guimarães Rosa

O Espelho – Guimarães Rosa

Se quer seguir-me, narro-lhe; não uma aventura, mas experiência, a que me induziram, alternadamente, séries de raciocínios e intuições. Tomou-me tempo, desânimos, esforços. Dela me prezo, sem vangloriar-me. Surpreendo-me, porém, um tanto à-parte de todos, penetrando conhecimento que os outros ainda ignoram. O senhor, por exemplo, que sabe e estuda, suponho nem tenha idéia do que seja na verdade — um espelho? Demais, decerto, das noções de física, com que se familiarizou, as leis da óptica. Reporto-me ao transcendente. Tudo, aliás, é a ponta de um mistério. Inclusive, os fatos. Ou a ausência deles. Duvida? Quando nada acontece, há um milagre que não estamos vendo.

Fixemo-nos no concreto. O espelho, são muitos, captando-lhe as feições; todos refletem-lhe o rosto, e o senhor crê-se com aspecto próprio e praticamente imudado, do qual lhe dão imagem fiel. Mas — que espelho? Há-os «bons» e «maus», os que favorecem e os que detraem; e os que são apenas honestos, pois não. E onde situar o nível e ponto dessa honestidade ou fidedignidade? Como é que o senhor, eu, os restantes próximos, somos, no visível? O senhor dirá: as fotografias o comprovam. Respondo: que, além de prevalecerem para as lentes das máquinas objeções análogas, seus resultados apóiam antes que desmentem a minha tese, tanto revelam superporem-se aos dados iconográficos os índices do misterioso. Ainda que tirados de imediato um após outro, os retratos sempre serão entre si muito diferentes. Se nunca atentou nisso, é porque vivemos, de modo incorrigível, distraídos das coisas mais importantes. E as máscaras, moldadas nos rostos? Valem, grosso modo, para o falquejo das formas, não para o explodir da expressão, o dinamismo fisionômico. Não se esqueça, é de fenômenos sutis que estamos tratando.

Resta-lhe argumento: qualquer pessoa pode, a um tempo, ver o rosto de outra e sua reflexão no espelho. Sem sofisma, refuto-o. O experimento, por sinal ainda não realizado com rigor, careceria de valor científico, em vista das irredutíveis deformações, de ordem psicológica. Tente, aliás, fazê-lo, e terá notáveis surpresas. Além de que a simultaneidade torna-se impossível, no fluir de valores instantâneos. Ah, o tempo é o mágico de todas as traições… E os próprios olhos, de cada um de nós, padecem viciação de origem, defeitos com que cresceram e a que se afizeram, mais e mais. Por começo, a criancinha vê os objetos invertidos, daí seu desajeitado tactear; só a pouco e pouco é que consegue retificar, sobre a postura dos volumes externos, uma precária visão. Subsistem, porém, outras pechas, e mais graves. Os olhos, por enquanto, são a porta do engano; duvide deles, dos seus, não de mim. Ah, meu amigo, a espécie humana peleja para impor ao latejante mundo um pouco de rotina e lógica, mas algo ou alguém de tudo faz frincha para rir-se da gente… E então?

Note que meus reparos limitam-se ao capítulo dos espelhos planos, de uso comum. E os demais — côncavos, convexos, parabólicos — além da possibilidade de outros, não descobertos, apenas, ainda? Um espelho, por exemplo, tetra ou quadridimensional? Parece-me não absurda, a hipótese. Matemáticos especializados, depois de mental adestramento, vieram a construir objetos a quatro dimensões, para isso utilizando pequenos cubos, de várias cores, como esses com que os meninos brincam. Duvida?

Vejo que começa a descontar um pouco de sua inicial desconfiança, quanto ao meu são juízo. Fiquemos, porém, no terra-a-terra. Rimo-nos, nas barracas de diversões, daqueles caricatos espelhos, que nos reduzem a mostrengos, esticados ou globosos. Mas, se só usamos os planos — e nas curvas de um bule tem-se sofrível espelho convexo, e numa colher brunida um côncavo razoável — deve-se a que primeiro a humanidade mirou-se nas superfícies de água quieta, lagoas, lameiros, fontes, delas aprendendo a fazer tais utensílios de metal ou cristal. Tirésias, contudo, já havia predito ao belo Narciso que ele viveria apenas enquanto a si mesmo não se visse… Sim, são para se ter medo, os espelhos.

Temi-os, desde menino, por instintiva suspeita. Também os animais negam-se a encará-los, salvo as críveis excepções. Sou do interior, o senhor também; na nossa terra, diz-se que nunca se deve olhar em espelho às horas mortas da noite, estando-se sozinho. Porque, neles, às vezes, em lugar de nossa imagem, assombra-nos alguma outra e medonha visão. Sou, porém, positivo, um racional, piso o chão a pés e patas. Satisfazer-me com fantásticas não-explicações? — jamais. Que amedrontadora visão seria então aquela? Quem o Monstro?

Sendo talvez meu medo a revivescência de impressões atávicas? O espelho inspirava receio supersticioso aos primitivos, aqueles povos com a idéia de que o reflexo de uma pessoa fosse a alma. Via de

regra, sabe-o o senhor, é a superstição fecundo ponto de partida para a pesquisa. A alma do espelho — anote-a — esplêndida metáfora. Outros, aliás, identificavam a alma com a sombra do corpo; e não lhe terá escapado a polarização: luz—treva. Não se costumava tapar os espelhos, ou voltá-los contra a parede, quando morria alguém da casa? Se, além de os utilizarem nos manejos da magia, imitativa ou simpática, videntes serviam-se deles, como da bola de cristal, vislumbrando em seu campo esboços de futuros fatos, não será porque, através dos espelhos, parece que o tempo muda de direção e de velocidade? Alongo-me, porém. Contava-lhe…

— Foi num lavatório de edifício público, por acaso. Eu era moço, comigo contente, vaidoso. Descuidado, avistei… Explico-lhe: dois espelhos — um de parede, o outro de porta lateral, aberta em ângulo propício — faziam jogo. E o que enxerguei, por instante, foi uma figura, perfil humano, desagradável ao derradeiro grau, repulsivo senão hediondo. Deu-me náusea, aquele homem, causava-me ódio e susto, eriçamento, espavor. E era — logo descobri… era eu, mesmo! O senhor acha que eu algum dia ia esquecer essa revelação?

Desde aí, comecei a procurar-me — ao eu por detrás de mim — à tona dos espelhos, em sua lisa, funda lâmina, em seu lume frio. Isso, que se saiba, antes ninguém tentara. Quem se olha em espelho, o faz partindo de preconceito afetivo, de um mais ou menos falaz pressuposto: ninguém se acha na verdade feio: quando muito, em certos momentos, desgostamo-nos por provisoriamente discrepantes de um ideal estético já aceito. Sou claro? O que se busca, então, é verificar, acertar, trabalhar um modelo subjetivo, preexistente; enfim, ampliar o ilusório, mediante sucessivas novas capas de ilusão. Eu, porém, era um perquiridor imparcial, neutro absolutamente. O caçador de meu próprio aspecto formal, movido por curiosidade, quando não impessoal, desinteressada; para não dizer o urgir científico. Levei meses.

Sim, instrutivos. Operava com toda a sorte de astúcias: o rapidíssimo relance, os golpes de esguelha, a longa obliqüidade apurada, as contra-surpresas, a finta de pálpebras, a tocaia com a luz de-repente acesa, os ângulos variados incessantemente. Sobretudo, uma inembotável paciência. Mirava-me, também, em marcados momentos — de ira, medo, orgulho abatido ou dilatado, extrema alegria ou tristeza. Sobreabriam-se-me enigmas. Se, por exemplo, em estado de ódio, o senhor enfrenta objetivamente a sua imagem, o ódio reflui e recrudesce, em tremendas multiplicações: e o senhor vê, então, que, de fato, só se odeia é a si mesmo. Olhos contra os olhos. Soube-o: os olhos da gente não têm fim. Só eles paravam imutáveis, no centro do segredo. Se é que de mim não zombassem, para lá de uma máscara. Porque, o resto, o rosto, mudava permanentemente. O senhor, como os demais, não vê que seu rosto é apenas um movimento deceptivo, constante. Não vê, porque mal advertido, avezado; diria eu: ainda adormecido, sem desenvolver sequer as mais necessárias novas percepções. Não vê, como também não se vêem, no comum, os movimentos translativo e rotatório deste planeta Terra, sobre que os seus e os meus pés assentam. Se quiser, não me desculpe; mas o senhor me compreende.

Sendo assim, necessitava eu de transverberar o embuço, a travisagem daquela máscara, a fito de devassar o núcleo dessa nebulosa — a minha vera forma. Tinha de haver um jeito. Meditei-o. Assistiram-me seguras inspirações.

Concluí que, interpenetrando-se no disfarce do rosto externo diversas componentes, meu problema seria o de submetê-las a um bloqueio “visual” ou anulamento perceptivo, a suspensão de uma por uma, desde as mais rudimentares, grosseiras, ou de inferior significado. Tomei o elemento animal, para começo.

Parecer-se cada um de nós com determinado bicho, relembrar seu facies, é fato. Constato-o, apenas; longe de mim puxar à bimbalha temas de metempsicose ou teorias biogenéticas. De um mestre, aliás, na ciência de Lavater, eu me inteirara no assunto. Que acha? Com caras e cabeças ovinas ou eqüinas, por exemplo, basta- lhe relancear a multidão ou atentar nos conhecidos, para reconhecer que os há, muitos. Meu sósia inferior na escala era, porém — a onça. Confirmei-me disso. E, então, eu teria que, após dissociá-los meticulosamente, aprender a não ver, no espelho, os traços que em mim recordavam o grande felino. Atirei-me a tanto.

Releve-me não detalhar o método ou métodos de que me vali, e que revezavam a mais buscante análise e o estrênuo vigor de abstração. Mesmo as etapas preparatórias dariam para aterrar a quem menos pronto ao árduo. Como todo homem culto, o senhor não desconhece a Ioga, e já a terá praticado, quando não seja, em suas mais elementares técnicas. E, os “exercícios espirituais” dos jesuítas, sei de filósofos e pensadores incréus que os cultivam, para aprofundarem-se na capacidade de concentração, de par com a imaginação criadora… Enfim, não lhe oculto haver recorrido a meios um tanto empíricos: gradações de luzes, lâmpadas coloridas, pomadas fosforescentes na obscuridade. Só a uma expediência me recusei, por medíocre senão falseadora, a de empregar outras substâncias no aço e estanhagem dos espelhos. Mas, era principalmente no modus de focar, na visão parcialmente alheada, que eu tinha de agilitar-me: olhar não-vendo.. Sem ver o que, em meu rosto, não passava de reliquat bestial. Ia-o conseguindo?

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Saiba que eu perseguia uma realidade experimental, não uma hipótese imaginária. E digo-lhe que nessa operação fazia reais progressos. Pouco a pouco, no campo-de-vista do espelho, minha figura reproduzia-se-me lacunar, com atenuadas, quase apagadas de todo, aquelas partes excrescentes. Prossegui. Já aí, porém, decidindo- me a tratar simultaneamente as outras componentes, contingentes e ilusivas. Assim, o elemento hereditário — as parecenças com os pais e avós — que são também, nos nossos rostos, um lastro evolutivo residual. Ah, meu amigo, nem no ovo o pinto está intacto. E, em seguida, o que se deveria ao contágio das paixões, manifestadas ou latentes, o que ressaltava das desordenadas pressões psicológicas transitórias. E, ainda, o que, em nossas caras, materializa idéias e sugestões de outrem; e os efêmeros interesses, sem seqüência nem antecedência, sem conexões nem fundura. Careceríamos de dias, para explicar-lhe. Prefiro que tome minhas afirmações por seu valor nominal.

À medida que trabalhava com maior mestria, no excluir, abstrair e abstrar, meu esquema perspectivo clivava-se, em forma meândrica, a modos de couve-flor ou bucho de boi, e em mosaicos, e francamente cavernoso, como uma esponja. E escurecia-se. Por aí, não obstante os cuidados com a saúde, comecei a sofrer dores de cabeça. Será que me acovardei, sem menos? Perdoe-me, o senhor, o constrangimento, ao ter de mudar de tom para confidência tão humana, em nota de fraqueza inesperada e indigna. Lembre-se, porém, de Terêncio. Sim, os antigos; acudiu-me que representavam justamente com um espelho, rodeado de uma serpente, a Prudência, como divindade alegórica. De golpe, abandonei a investigação. Deixei, mesmo, por meses, de me olhar em qualquer espelho.

Mas, com o comum correr quotidiano, a gente se aquieta, esquece-se de muito. O tempo, em longo trecho, é sempre tranqüilo. E pode ser, não menos, que encoberta curiosidade me picasse. Um dia… Desculpe- me, não viso a efeitos de ficcionista, inflectindo de propósito, em agudo, as situações. Simplesmente lhe digo que me olhei num espelho e não me vi. Não vi nada. Só o campo, liso, às vácuas, aberto como o sol, água limpíssima, à dispersão da luz, tapadamente tudo. Eu não tinha formas, rosto? Apalpei-me, em muito. Mas, o invisto. O ficto. O sem evidência física. Eu era — o transparente contemplador?… Tirei-me. Aturdi-me, a ponto de me deixar cair numa poltrona.

Com que, então, durante aqueles meses de repouso, a faculdade, antes buscada, por si em mim se exercitara! Para sempre? Voltei a querer encarar-me. Nada. E, o que tomadamente me estarreceu: eu não via os meus olhos. No brilhante e polido nada, não se me espelhavam nem eles!

Tanto dito que, partindo para uma figura gradualmente simplificada, despojara-me, ao termo, até à total desfigura. E a terrível conclusão: não haveria em mim uma existência central, pessoal, autônoma? Seria eu um… desalmado? Então, o que se me fingia de um suposto eu, não era mais que, sobre a persistência do animal, um pouco de herança, de soltos instintos, energia passional estranha, um entrecruzar-se de influências, e tudo o mais que na impermanência se indefine? Diziam-me isso os raios luminosos e a face vazia do espelho — com rigorosa infidelidade. E, seria assim, com todos? Seríamos não muito mais que as crianças — o espírito do viver não passando de ímpetos espasmódicos, relampejados entre miragens: a esperança e a memória.

Mas, o senhor estará achando que desvario e desoriento-me, confundindo o físico, o hiperfísico e o transfísico, fora do menor equilíbrio de raciocínio ou alinhamento lógico — na conta agora caio. Estará pensando que, do que eu disse, nada se acerta, nada prova nada. Mesmo que tudo fosse verdade, não seria mais que reles obsessão auto-sugestiva, e o despropósito de pretender que psiquismo ou alma se retratassem em espelho…

Dou-lhe razão. Há, porém, que sou um mau contador, precipitando-me às ilações antes dos fatos, e, pois: pondo os bois atrás do carro e os chifres depois dos bois. Releve-me. E deixe que o final de meu capítulo traga luzes ao até agora aventado, canhestra e antecipadamente.

São sucessos muito de ordem íntima, de caráter assaz esquisito. Narro-os, sob palavra, sob segredo. Pejo-me. Tenho de demais resumi-los.

Pois foi que, mais tarde, anos, ao fim de uma ocasião de sofrimentos grandes, de novo me defrontei — não rosto a rosto. O espelho mostrou-me. Ouça. Por um certo tempo, nada enxerguei. Só então, só depois: o tênue começo de um quanto como uma luz, que se nublava, aos poucos tentando-se em débil cintilação, radiância. Seu mínimo ondear comovia-me, ou já estaria contido em minha emoção? Que luzinha, aquela, que de mim se emitia, para deter-se acolá, refletida, surpresa? Se quiser, infira o senhor mesmo.

São coisas que se não devem entrever; pelo menos, além de um tanto. São outras coisas, conforme pude

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distinguir, muito mais tarde — por último — num espelho. Por aí, perdoe-me o detalhe, eu já amava — já aprendendo, isto seja, a conformidade e a alegria. E… Sim, vi, a mim mesmo, de novo, meu rosto, um rosto; não este, que o senhor razoavelmente me atribui. Mas o ainda-nem-rosto — quase delineado, apenas — mal emergindo, qual uma flor pelágica, de nascimento abissal… E era não mais que: rostinho de menino, de menos- que-menino, só. Só. Será que o senhor nunca compreenderá?

Devia ou não devia contar-lhe, por motivos de talvez. Do que digo, descubro, deduzo. Será, se? Apalpo o evidente? Tresbusco. Será este nosso desengonço e mundo o plano — intersecção de planos — onde se completam de fazer as almas?

Se sim, a “vida” consiste em experiência extrema e séria; sua técnica — ou pelo menos parte — exigindo o consciente alijamento, o despojamento, de tudo o que obstrui o crescer da alma, o que a atulha e soterra? Depois, o “salto mortale”… — digo-o, do jeito, não porque os acrobatas italianos o aviventaram, mas por precisarem de toque e timbre novos as comuns expressões, amortecidas… E o julgamento-problema, podendo sobrevir com a simples pergunta: — ”Você chegou a existir?

Sim? Mas, então, está irremediavelmente destruída a concepção de vivermos em agradável acaso, sem razão nenhuma, num vale de bobagens? Disse. Se me permite, espero, agora, sua opinião, mesma, do senhor, sobre tanto assunto. Solicito os reparos que se digne dar-me, a mim, servo do senhor, recente amigo, mas companheiro no amor da ciência, de seus transviados acertos e de seus esbarros titubeados. Sim?

ROSA, Guimarães, Primeiras Estórias, página 119 até 128.

Literatura para ouvir

audiobooks: o podcast do passado

vocês sabiam que no Youtube existem vários áudiobooks dos clássicos da nossa literatura brasileira? E, assim: super bem narrados, com trilha sonora, emoção e MUITA cultura?

Dá pra ouvir na esteira, no trânsito, no ónibus, lavando louça…

aqui, 2 dos nossos favoritos:

Grande Sertão Veredas, Guimarães Rosa:

São 26 partes de cerca de 25 minutos cada uma, é sensacional! Um dos melhores audiobooks dessa Internet: o tom do narrador, a música de fundo, as gírias… fora que cada frase Guimarães é pura prosa poética, pra ouvir, se apaixonar e sair por aí querendo falar roseanês <3

Dom Casmurro, Machado de Assis:

Cláááássico. Um romance inesgotável. Quando mais você ouve, menos você sabe. Neste aqui vão umas 7 horas. Vocês não imaginam como cresce a produtividade no trabalho ouvir Machado. Parece que você está conversando com alguém muito sensível, muito formal e ao mesmo tempo generoso e maluco. Uma brincadeira engraçada é deixar uma folha em branco com caneta ao lado e anotar uma palavra ou mesmo frases que encantam seus ouvidos durante a narrativa. Essa nossa língua portuguesa deixa a gente apaixonada que só. Dar um tempo nos stickers e nos emojis faz bem pra alma, viu? Recreio pra anestesia cerebral.

Comecem com esses dois, Só apertar o play e abrir o coração.

literatura brasileira: 14 romances pra vc ler e se apaixonar (por si mesmo, pela vida, pelos autores…)

Fizemos uma lista dos romances essenciais da literatura brasileira:  aqueles que ajudaram a formar a nossa tradição literária, são estudados e conhecidos em todo mundo e estão praticamente em todas as provas de conhecimento sobre literatura.

Mas não só isso: indicamos alguns livros mais contemporâneos que também são muito importantes para a literatura nacional e outros que não são romances, mas também marcaram história. #partiu?

1) Dom Casmurro (1889), de Machado de Assis

dom casmurro - coletivolirico- livros importantes da literatura brasileira

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Difícil seria começar essa lista com um romance diferente: Dom Casmurro é considerado por especialistas o maior romance da literatura nacional. A história de amor e tragédia do triângulo Bentinho, Capitu e Escobar é envolvente do começo ao fim, cheia de detalhes e reflexões e expõe o lado mais genial do autor.

Por que você deveria ler?

Além de ser uma excelente pedida para quem gosta de ler sobre as desventuras do amor (e outras coisas mais), é a obra machadiana mais característica. E, afinal, todo mundo quer ter a sua própria para resposta para “Capitu traiu ou não traiu Bentinho?”

“Dizem por ai, mas não tenho certeza, que meu sorriso fica mais feliz quando te vejo, dizem também que meus olhos brilham, dizem também que é amor, mas isso sim é certeza”

Machado de Assis em Dom Casmurro

Não dá para não citar: Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881)

Também um clássico de Machado de Assis, é talvez a história mais incrível que você lerá da perspectiva de um defunto. É engraçado, inteligente, irônico e inovador! Não se assuste com o fato de ter sido lançada há mais de 100 anos. Memórias Póstumas é desses livros atemporais que encantam qualquer um.

2) Macunaíma (1928), de Mário de Andrade

livros importantes da literatura brasileira

O conhecido “herói sem nenhum caráter” já virou filme, inspirou novelas, peças de teatro e outras inúmeras expressões artísticas. O protagonista é um homem nacional com uma identidade muito particular, que mistura comédia, malandragem e preguiça. As aventuras do herói tornaram-se muito importantes por retratar as várias facetas do caráter brasileiro.

Por que você deveria ler?

Se aventura e humor fazem o seu tipo, este é o livro certo. A linguagem falada é muito interessante e o livro oferece um rico retrato da cultura folclórica brasileira.

3) Vidas Secas (1938), de Graciliano Ramos

livros importantes da literatura brasileira

São quadros da realidade de pessoas que têm que migrar de canto em canto fugindo da seca do sertão brasileiro. Os nordestinos, protagonistas dessa história, são castigados na busca por uma vida melhor e o livro traça, em forma de capítulos não lineares, uma obra-prima da literatura regionalista nacional.

Por que você deveria ler?

Você com certeza vai se emocionar com a história dessa família nordestina, mas não só isso: o livro é tão inteligente que monta um quebra cabeça com seus capítulos e, se quiser, você pode ler um por vez, com a maior calma do mundo, ou seja: não há desculpa para começar já.

Cinco sombras caminhavam naquele leito seco. Percorriam um calvário como Jesus, açoitados pela fome, pela miséria. Coisa séria.

Graciliano Ramos em Vidas Secas

4) Triste Fim de Policarpo Quaresma (1915), de Lima Barreto

livros importantes da literatura brasileira

Muitos críticos encaram a história do protagonista Quaresma como um reflexo do próprio Lima Barreto. Ele foi filho de pai português com uma mãe escravizada e sofreu por toda vida com uma sociedade que não o aceitava. Policarpo, major aposentado, era tão nacionalista que acabou por ser tomado como louco: viveu rejeitado e vítima de seus próprios ideais.

Por que você deveria ler?

Um livro que retrata bem a política nacional pós-escravidão, no final do século XIX e começo do XX. Se você gosta de política e história, vai se deliciar com este romance que debate questões políticas e de identidade nacional.

5) Grande Sertão: Veredas (1956), de Guimarães Rosa

livros importantes da literatura brasileira

Nesta epopéia da literatura brasileira, o sertão é o mundo. É narrada por Riobaldo, um ex-jagunço que filosofa sobre a vida, sobre o sertão, sobre as guerras que viveu e um amor perdido: Diadorim, mulher que se travestia de homem para conseguir viver entre os jagunços.

Por que você deveria ler?

O livro é uma verdadeira enciclopédia do sertão, a linguagem é encantadora e as aventuras de Riobaldo formam um verdadeiro labirinto literário que você não vai querer sair. Se você gosta de histórias longas, com muitos personagens e reviravoltas, vai amar Grande Sertão Veredas.

A vida da gente vai em erros, como um relato sem pés nem cabeça, por falta de sisudez e alegria. Vida devia de ser como sala do teatro, cada um inteiro fazendo com forte gosto seu papel, desempenho.

Guimarães Rosas em Grande Sertão Veredas

6) A Pedra do Reino (1971), Ariano Suassuna

livros importantes da literatura brasileira

O nome inteiro da obra é, na verdade, Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta. O título denuncia a monumentalidade da escrita de Suassuna, que na época de seu lançamento foi considerada um marco na literatura nordestina. O narrador está preso e tenta argumentar a sua defesa contando a história de sua família, supostamente descendente de reis.

Por que você deveria ler?

O livro é pura cultura popular brasileira. Ao melhor estilo O Auto da Compadecida. Já foi adaptado para o cinema, teatro e televisão e é uma mistura de diversão e cultura, gostoso de ler. Além disso, também tem uma boa dose de magia: se você gosta de histórias míticas e fantásticas, não pode perder!

7) O Cortiço (1890), de Aluísio de Azevedo

livros importantes da literatura brasileira

A realidade miserável e tumultuada das famílias cariocas no século XIX é o pano de fundo para este romance clássico. O Cortiço é o precursor da vida nas favelas do Rio de Janeiro e fala sobre exploração social, racismo e outros temas críticos.

Por que você deveria ler?

É peça chave para entender o Brasil do século XIX e o movimento naturalista, que ressalta os instintos naturais dos personagens. Se você tem interesse em crítica social, este romance irá te dar o cenário perfeito para reflexões.

Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas. Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada sete horas de chumbo.

Aluísio de Azevedo em O Cortiço

8) O Quinze (1930), de Rachel de Queiroz

livros importantes da literatura brasileira

A autora tinha apenas 19 anos quando escreveu esse romance que se tornou um clássico. A seca de 1915 no Ceará é o cenário para contar as histórias de duas famílias que vivem uma grande desigualdade social no nordeste. A saga da família de Chico Bento e a história de amor entre Vicente e Conceição cativam o leitor do início ao fim da leitura.

Por que você deveria ler?

A linguagem é simples, o regionalismo está presente de forma muito bonita e o livro é também sobre a emancipação das mulheres. Rachel de Queiroz foi a primeira mulher a receber o Prêmio Camões, por esta obra. É motivo o suficiente ou não é?

9) O Guarani (1857), de José de Alencar

livros importantes da literatura brasileira

É uma história que conta a fundação do Brasil como enxergava José de Alencar: a mistura do índio com o branco, da cidade e o campo. Peri é o índio e herói nacional cheio de virtudes que se apaixona por Ceci, a portuguesa branca, pura e perfeita. Os personagens que cercam a história também têm papéis alegóricos que representam o Brasil pós-colonial.

Por que você deveria ler?

Importante para entender a realidade brasileira do século XVII e também é uma história envolvente, que foi construída com ajuda de leitores: lançada originalmente no formato de folhetim, José de Alencar foi moldando o romance conforme as críticas das pessoas que iam lendo a história de Peri e Ceci no jornal. Isso concede à narrativa uma autenticidade clara.

Os lábios vermelhos e úmidos pareciam uma flor de gardênia dos nossos campos, orvalhada pelo sereno da noite, o hálito doce e ligeiro exalava-se formando um sorriso. Sua tez alva e pura como um froco de algodão, tingia-se nas faces de um longe cor-de-rosa, que iam, desmaiando, morrer no colo de linhas suaves e delicadas.

José de Alencar em O Guarani

10) A Rosa do Povo (1945), de Carlos Drummond de Andrade

livros importantes da literatura brasileira

São 55 poemas que expressam o melhor do mais renomado poeta brasileiro. Mesmo sendo um livro de poesia, A Rosa do Povo sempre figura na lista dos livros importantes da literatura nacional porque trata de temas como o pós-Segunda Guerra, a vida na cidade, o amor e a morte. Rio de Janeiro é o pano de fundo para esses versos que são uma obra-prima do autor.

Por que você deveria ler?

Qualquer pessoa que gosta de poesia deveria ler esta obra, não só por ser uma das mais importantes, mas também porque é bela, profunda, e muito diversa. É um desses livros que vale a pena ter na cabeceira.

11) A Paixão Segundo G.H. (1964), de Clarice Lispector

livros importantes da literatura brasileira

Pobre menina rica, já ouviu essa expressão? É mais ou menos o que define a protagonista desse romance, G.H., uma mulher bem sucedida, mas que conhece muito pouco de si mesma. No decorrer das páginas, ela mergulha em seus próprios pensamentos para tentar se encontrar e refletir sobre sua relação íntima consigo e com a vida.

Por que você deveria ler?

A narrativa psicológica que se tornou uma marca de Clarice Lispector é muito bem desenvolvida neste livro, que pode gerar reflexões profundas no leitor. Se o que você está procurando é uma leitura que vai te causar questionamentos, mudanças e burburinhos no interior, este é o livro certo.

Todo momento de ‘falta de sentido’ é exatamente a assustadora certeza de que ali há o sentido, e que não somente eu não alcanço, como não quero, porque não tenho garantias.

Clarice Lispector em A Paixão Segundo G.H.

Não dá para não citar: A Hora da Estrela (1977).

O último livro publicado de Clarice e um dos mais conhecidos conta a história de Macabéa, uma garota nordestina que tenta sobreviver na cidade. É também um livro que filosofa sobre a vida, a arte e o próprio ato de escrever. Indispensável para quem gosta de praticar escrita

12) As Meninas (1973), de Lygia Fagundes Telles

livros importantes da literatura brasileira

A história de Ana Clara, Lia e Lorena, meninas que estão saindo da adolescência e entrando nos conflitos amorosos, políticos e sociais de uma sociedade que vive em plena ditadura militar. Por se passar em um pensionato de freiras, a história ganha ainda mais emoção, pois gera um conflito social que mistura solidão, aventura e defesa de liberdade.

Por que você deveria ler?

Fundamental para ter uma ideia de como era a sociedade brasileira na época da ditadura. Você vai se apaixonar pela individualidade das meninas e pela trajetória cheia de reviravoltas que elas traçam. A miséria política e cultural da época é passada através de uma linguagem simples e muito fácil de entender. É para ler num piscar de olhos!

13) Morte e Vida Severina (1967), de João Cabral de Melo Neto

livros importantes da literatura brasileira

Mais uma obra que trata do tema da seca, dos retirantes e da miséria. Mas desta vez, em forma de poema! Dividido em 18 partes, a obra conta a trajetória de Severino, que deixa o sertão em busca de melhores condições de vida no litoral, e os personagens, também sofridos e “severinos” que ele encontra no caminho.

Por que você deveria ler?

Se você nunca teve contato com a literatura de cordel, com poemas grandes e narrativas poéticas dramáticas, sugerimos começar por este. É um texto que transborda emoção e que consagrou o autor nacional e internacionalmente.

e aí, qual o próximo da sua lista de cabeceira?

vôo do pensamento

Todo abismo é navegável a barquinhos de papel

João Guimarães Rosa, em Desenredo, conto integrante de Tutaméia – Terceiras Estórias

 

Tem gente que têm não consegue nem fazer um daqueles aviõeszinhos de papel simples – daquele tipo que já caia de bico nos primeiros segundos de voo. Bom, digamos que esse não é o caso de Luca Iaconi-Stewart, de 25 anos, que se diz “um louco que ama a aviação”.

Faz sentido: o jovem gosta tanto do assunto que se especializou na técnica de construção de aeronaves à base de celulose! Sim, papel gente!

Olha só a réplica caseira do jato Air India Boeing 777

(resultado de um trabalho de nove anos – nem precisava voar pra fazer bonito)

Na verdade, o objetivo de Luca era fazer com que o protótipo voasse de fato. Mas não com um impulso qualquer da mão: o jato tem seu próprio motor, e só esse motor precisou de um mês de projeto e quatro de montagem. (!!!)

O mais impressionante é que, mesmo sem estudar engenharia – teve apenas aulas de arquitetura no ensino médio –, esse moço de São Francisco, Califórnia (EUA), resolveu fazer um modelo fiel ao original, em todos os seus detalhes. E, aqui, estamos falando inclusive de parafusos, tubos hidráulicos e dobradiças, além de carrinhos de comida e compartimentos de dormir para a tripulação…

Luca nem consultou os universitários para empreender sua missão:  no processo, analisou centenas de fotos e vídeos do avião na internet (um viva ao google!). Deu sorte de encontrar também na rede um manual de manutenção do Air India Boeing 777 e um mapa dos assentos do jato.

Diz que ele também recebeu algumas dicas quentes de um amigo que trabalha na GE Aviation, fabricante do motor do Boeing…

Olha só o trem de pouso da brincadeira!

 

 

Oiê Luca! :)

O avião de papel de Luca ainda está em fase de conclusão, com a manufatura das asas – só elas demandaram dois anos de trabalho.

Depois de tanto esforço, orgulhoso de seu feito, o rapaz agradece também aos pais por ter conseguido concluir a empreitada. “Tenho sorte por ter um família tão solidária”, afirma.

Nada mais justo o agradecimento, afinal, talvez o projeto não tivesse levantado voo se a toda hora alguém interrompesse sua concentração com alguma observação do tipo: “Menino! Vai estudar! Ninguém chega a lugar algum com a cabeça nas nuvens!”

Aviõezinhos de papel comuns talvez não cheguem mesmo, o que não é o caso desse Boeing.

 

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