por Helô Gomes | dez 4, 2019 | música
Por Helô Gomes
Tem duas situações na minha vida que eu fico realmente preocupada quanto ao meu auto-conhecimento:
- uma é quando eu não sei quem eu quero ser, logo, não tenho a menor idéia do que vestir – geralmente, depois de decidir qual o tom de Helô que quero para aquele dia em específico, costumo sabe de cara o look que vou usar: assim que selecionada a vibe, o resto vem tranquilo… Não costumo ficar experimentando muita roupa não.
- a outra é quando eu não tenho a menor idéia do que quero escutar de música. Tipo assim: Gaiola das Popozudas ou Gymnopedie 1, do Satie, me parecem igualmente estimulantes para uma corrida na esteira ou uma tarde de trabalho. E, acreditem: elas funcionam nos dois momentos.
Bom, aí que entra esse post! Decidi fazer uma lista das top 5 músicas que geram a sensação de maravilhosidade em qualquer lugar, a qualquer hora, com qualquer pessoa. Quase como um pretinho básico sonoro, aquela camiseta branca perfeita com o jeans ideal só que em versão fonogáfica, sabe como?
Coloca o fone de ouvido, abre a planilha do Excel pra fingir que tá analisando uns números e vem comigo:
1 – De Todos os Loucos do Mundo – Clarice Falcão
Essa música é fabulosa por um motivo genial: ela fala de um negócio chamado hoje. E tem coisa mais linda nessa vida do que essa belezinha que a gente chama de agora?
Porque assim: tem letra que só fala de passado e dá uma tristeza meio estranha por motivos óbvios de presenças ausentes e ferida de saudade que dói e a gente sente sim, viu Camões! Tem aquelas músicas que só falam de futuro e, dependendo do clima, você se empolga, fica afim de começar dieta, faz mil planos imaginários pra próxima sexta-feira, se concentra em tomar aquele um litro de água pra ver se a pele dá um glow extra… Mas não há nada mais delicioso do que uma letra de música que te leve para o exato momento do agora. E os loucos da Clarice vivem todos neste belíssimo dia que você aí e eu daqui estamos vivendo, sim, agorinha mesmo. Os loucos da Clarice confessam mais do que sentimento: confessam realidade de sensações: fala de troca, de compreensão, de amor.. fala do oposto do que é estar sozinha. E você pode fazer dueto com uma amiga, o namorado, vários amigos, vários namorados e, se você der sorte, pode ter uma pessoa todinha sua pra cantar a letra tipo Faroeste Caboclo e aí, meu bem, só tenho uma coisa pra te dizer: somebody got you, babe. <3
2 – Lua de Cristal – Xuxa
Clássica dos karaokês, Lua de Cristal é tipo o hino da marcha dos ursinhos carinhosos. Fala sério: não dá pra não ser feliz ao som de “todos somos um e juntos não existe mal nenhum”, minha gente. E, não sei vocês, mas sempre faço uma lista mental das coisas que quero que o cara lá de cima me dê capacidade pra lutar enquanto seguro o fôlego pra aguentar mais um refrão de que eu já sei brilhar. Tem mais: é tanta repetição que fica quase impossível cantar sozinha essa música, ou seja, tem sempre uma boa lembrança da zueira envolvendo as migas quando a gente aperta o play nesse hit topíssimo da Xuxa. É sorriso garantido e energia renovada. Vai por mim…
3 – Let’s do it – Louis Armstrong
Pra mim, a música mais sexy, apaixonada e egoísta que já existiu na história do jazz. E, acreditem em mim: apesar de parecer contraditório, não tem nada de mal uma letra ser ao mesmo tempo uma declaração para outra pessoa e para a gente mesma. Porque assim: a maioria das músicas românticas depende da reação do destinatário da música pra completar o círculo. Nessa, não acontece isso. É tipo amar verbo intransitivo mesmo: “olha que lindo, amor, as abelhas tão se amando, os mosquitos tão se amando, os peixes tão se amando, por que a gente não se pega também, vai, libera aí” e aí a resposta não vem e o que o Louis faz? Fica amando mais ainda as coisas que tão a sua volta e fica lá amarradão na própria brisa da imaginação. E lindo demais minha gente, os melhores 8 minutos da minha vida. TO-DA vez. Tentei achar no Youtube minha versão favorita que é a do álbum Verve Ultimate Cool (não achei, mas tem no Spotfy, aqui pra quem interessar possa).
4- Caraca, Muleque, Tiaguinho
Que dia, que isso?! Poe um pagodinho só pra relaxar… No trânsito, no escritório, na fila do banco, do supermercado, hoje a gente tá naquele pique de moleque doido e quando a gente tá assim, é como minha gente? No puro brilho, obviamente.
E olha, nada de fazer a vítima: ai não estou na praia, não estou tomando cerveja, estou sem dinheiro, bla bla bla bla. Você tá viva aí belíssima, lendo este texto maravilhosamente com esses olhos lindos que Deus te deu, coloca um rímel mara vida vida mara, escuta essa música no looping umas 15 vezes e eu du-vi-do que você vai pensar em bad… Afinal: o resto a gente corre atrás!
5– Leve – Mahmundi
Parece música de fossa, mas eu juro que não é se você escutar partindo do princípio de que você é maravilhosa. Explico: já ouviu uma música que fale sobre amor e, no lugar de visualizar uma outra pessoa ocupando o espaço do personagem pelo qual você se apaixona, você pensasse em si mesma? Como se você tivesse se conhecido num bar, tivesse batido um papo consigo mesma, tivesse se encantado absolutamente, se pegado loucamente (tipo amor ao primeiro like) e, alá! Foi recíproco! Você também ficou com os quatro pneus arriados por você mesma! Que baita romance, senhores e senhores, peguem a pipoca que essa história vai ser… sublime.
por Helô Gomes | jan 10, 2019 | cultura, cultura pop, música
É ótimo poder cantar a letra de uma música e captar o sentido de quem
a escreveu, não? Ainda mais quando descobrimos que, aquela canção tão
suave, tocante ou importante para nós é, na verdade, uma poesia (ou
inspirada em algumas estrofes e rimas).
Você já imaginou que Fagner musicou Florbela Espanca? Ou que Secos & Molhados cantou versos de Fernando Pessoa?
Confira nossa lista com vinte faixas que tiveram uma ajudinha de escritores e poetas para se tornarem melodias:
1) “Que deus te guie, porque eu não posso guiar”
Caetano foi um dos intérpretes brasileiros que mais musicou poemas,
poesias ou, como neste caso, prosas poéticas. Escrita por Haroldo de
Campos, circulado de fulô, é um tributo à tradição de ministreis nordestinos.
circuladô de fulô ao deus ao demodará que deus te guie
porque eu não posso guiá eviva quem já me deu circuladô de
fulô e ainda quem falta me dá
2) “Uma parte de mim, almoça e janta; outra parte se espanta”
Fã de grandes poetas, Fagner chegou a enviar um CD com diversos poemas de Ferreira Gullar musicados antes de lançar – e, aprovado pelo poeta, trouxe à público (e, como melodia) Contigo, Cantiga para Não Morrer (me leve), Menos a Mim e Rainha da Vida. Traduzir-se, contudo, é a mais conhecida das músicas-poesia desta dupla,
Traduzir-se uma parte
na outra parte
– que é uma questão
de vida ou morte –
será arte?
3) “Ah, que linda namorada!”Pode não parecer, porém, Minha Namorada, antes de ser uma música do mestre Vinícius de Moraes, é um poema. Nele, o poetinha convida sua amada ao posto de namorada e, quiçá, caso ela queira e aguente, amada para o resto da vida.
Você tem que me fazer um juramento
De só ter um pensamento
Ser só minha até morrer
E também de não perder esse jeitinho
De falar devagarinho
Essas histórias de você
4) “Lá tenho a mulher que eu quero, na cama que escolherei”
Poema de Manuel Bandeira, Vou-me Embora Para Pasárgada é conhecido
por vislumbrar um universo paralelo onde todas as coisas boas são
possíveis: andar de bicicletas, namorar moças bonitas, isolar-se da
infelicidade. O cantor Paulo Diniz foi quem o fez melodia.
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
5) “Amei-te sim ó virgem, amei-te!”
A poesia Medroso de Amor é de Juvenal Galeno, porém, foi transformada
em letra pelo pianista cearense Alberto Nepomuceno. Considerada de
gênero brejeiro, realça a beleza de um arquétipo da época: a moreninha.
Em 1968, ganhou reconhecimento na voz doce de Nara Leão, que contou com o
apoio dos arranjos de Rogério Duprat.
Não desfolhes, não sorrias
Que eu tenho medo d´amores
Que só trazem desventuras.
6) “Há tanta suavidade em nada se dizer”
Ney Matogrosso e sua banda também foram entusiastas da arte de ritmar
poesias. Inspirada em Fernando Pessoa e seu poema homônimo, a letra dos
músicos brasileiros externa a mesma sensação de saciedade frente ao
silêncio, contudo, não há versos comuns além do título.
Talvez que amanhã
Em outra paisagem
Digas que foi vã
Toda essa viagem
7) “É uma cova grande pra tua carne pouca, mas a terra dada, não se abre a boca”
Morte e Vida Severina, poema teatral de João Cabral de Melo Neto, foi
musicado por Chico Buarque um ano após o golpe militar sob a alcunha de
Funeral de um Lavrador. As disputas em torno da terra e da reforma
agrária foram alguns dos motivos que levaram o fluminense a transformar a
parte mais conhecida do enredo em alg
É a conta menor que tiraste em vida
É a parte que te cabe deste latifúndio
É a terra que querias ver dividida
8) “Meus olhos andam cegos, de te ver”
Mais um poema que Fagner gravou em sua coletânea de poesias musicadas
Sorriso Novo, de 1982. Sem alterações na letra, o cearense canta a
poesia Fanatismo, de Florbela Espanca.
E, olhos postos em ti, digo de rastros:
“Ah! podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: princípio e fim!…”
9) “Quem não presta fica vivo, quem é bom, mandam matar”
Escrito por Cecília Meireles, o poema Tema de Os Inconfidentes ganhou
forma, acordes e notas na voz de Chico Buarque. Inspirado na obra
lírica Romanceiro da Inconfidência, cada estrofe conta um dos
romances do livro.
Foi trabalhar para todos…
Mas, por ele, quem trabalha?
Tombado fica seu corpo,
Nessa esquisita batalha.
Suas ações e seu nome,
por onde a glória os espalha?
10) “Corro perigo como toda pessoa que vive”
Do trecho de Clarice Lispector, Cazuza arranjou, junto a Frejat, uma
bela música para a voz única de Cássia Eller: Que Deus o Venha. A
canção/prosa poética trata exatamente sobre o inesperado, a salvação
através do amor e o prazer de se estar vivo e devorar a vida.
Mas eu sei
Que vou ter paz antes da morte
Que eu vou experimentar um dia
O delicado da vida
Vou aprender
Como se come e vive
O gosto da comida
11) “E foi tanta felicidade que toda cidade se iluminou”
Valsinha, inicialmente montada como poema pelo poetinha, foi composta
em 1970. Vinicius a compôs essa e entregou-a a Chico Buarque, que logo
fez-lhe a letra e passou a cantá-la em seus shows.
E então ela se fez bonita como há muito tempo não queria ousar
Com seu vestido decotado cheirando a guardado de tanto esperar
Depois os dois deram-se os braços como há muito tempo não se usava dar
E cheios de ternura e graça, foram para a praça e começaram a se abraçar
12) “Que bicho é o homem, do que se enfeita?”
Podemos caracterizar Fagner como o poeta musical oficial do Brasil?
Acreditamos que sim. Desta vez, o instrumentista fez música do poema O
Bicho Homem, de Francisco Carvalho. O músico veio a conhecer o trabalho
do poeta e se encantou: “Eu pensei em fazer um disco muito mais ligado
aos ritmos nordestinos, à nossa cultura, talvez só com parcerias minhas
com Capinan. Mas quando li o primeiro poema dele, `O bicho homem’, dei
uma virada geral. Foi surpreendente. Um poeta que eu não conhecia,
cearense, anônimo até pra mim que sou conterrâneo!”.
O homem que vai
para a eternidade
num saco de lixo.
Que bicho é o homem
de salário fixo?
13) “Quando você ficar triste, que seja por um dia, e não o ano inteiro”
Frejat, que já havia participado da dobradinha entre Clarice
Lispector e Cazuza para musicar um dos trechos da autora, se inspirou em
Victor Hugo para criar a canção Amor Pra Recomeçar. O poema, antigo, é
nada mais que uma carta cheia de bons desejos ao próximo – e conseguiu
ser bem exprimida na canção, também esperançosa de boa vida.
Desejo, por sinal, que você seja triste
Não o ano todo, mas apenas um dia
Mas que nesse dia
Descubra que o riso diário é bom
O riso habitual é insosso
E o riso constante é insano.
14) “Tudo claro à noite, assim que é bom”
Paulo Leminski é muito conhecido por suas poesias desconstruídas e à
frente do tempo, porém, poucos sabem que o curitibano mantinha uma
relação bastante próxima com a música. Luzes, inicialmente uma poesia
sua, se tornou som quando cantada por Arnaldo Antunes.
Acenda a luz dos lampiões
Inflame a chama dos salões
Fogos de línguas de dragões
Vagalumes
15) “Um trabalho que fiz noutro planeta, onde nave flutua e disco voa”
Além de escritor e pesquisador de literatura fantástica, Bráulio
Tavares escreveu alguns poemas. Amigo próximo de Lenine, com quem também
já compôs em parceria, autorizou que o músico que o pernambucano
musicasse o poema O Marco Maciano, que fala aborda a vida em Marte e um
dos possíveis viventes.
Construi o meu marco na certeza
Que ninguém, cibernético ou humano.
Poderia romper as minhas guardas
Nem achar qualquer falha no meu plano
Ficam todos em Fobos ou em Deimos
Contemplando o meu marco marciano
16) “Só sei que canto de sede dos teus lábios”
A voz de Adriana Calcanhotto, por si só, já soa como poesia. Nenhuma
surpresa em a vez cantar algumas das estrofes da poesia Madeiras do
Oriente, de Waly Salomão. O nome canção, contudo, a gaúcha alterou para
Teu Nome Mais Secreto.
Só meu sangue sabe tua seiva e senha
E irriga as margens cegas
De tuas elétricas ribeiras,
Sendas de tuas grutas ignotas
17) “Se amor, eu nada seria”
Renato Russo e seus dois fieis escudeiros lançaram, em 1989, a música
Monte Castelo, dentro do álbum As Quatro Estações. Na letra romântica,
incluiu os versículos 1, 2 e 3 do capítulo 13 de Coríntios e o Soneto 11
de Luiz Vaz de Camões.
O amor é o fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.
18) “qual é a parte da tua estrada no meu caminho”
Quase Nada, conhecida no vocal manso de Zeca Baleiro, é, na verdade,
um poema de Alice Ruiz – companheira de anos de Leminski. A canção fala
sobre a vulnerabilidade do amor e pra onde o mesmo vai quando acaba.
se tudo passa como se explica
o amor que fica nessa parada
amor que chega sem dar aviso
não é preciso saber mais nada
18) “Muita felicidade é um rio que vai”
Junto a Moraes Moreira, Leminski novamente musicou uma de suas
poesias em Promessas Demais. Ney Matogrosso a reproduz com maestria até
os dias atuais.
Não precisava não acenar
Não precisava não promessas demais
Não precisava não acenar
Tanta felicidade é um rio que vai
O rio que vai, o rio que vai me levar
19) “It’s only life, but I like it”
A banda Porcas Borboletas é conhecida por já ter musicado letras de
Clara Averbuck e Arnaldo Antunes, porém, uma de suas faixas do último
álbum também é um poema do curitibano Paulo Leminski. Por compor rimas
ricas e carregadas de significado, muitos artistas o fizeram.
This is life
It is not
Rock and roll
20) “A cor mais alegre, a cor mais triste”
Tropicalista e encantado pelas poesias de Leminski, Caetano foi o
primeiro a fazer melodia em cima de um dos poemas do artista. Verdura,
homônimo de letra e música, a incluiu em seu álbum Outras Palavras, e
1981. A canção faz uma clara alusão à imposição sociocultural dos
Estados Unidos no Brasil.
De repente
Vendi meus filhos
A uma família americana
Eles têm carro
Eles têm grana
Eles têm casa
A grama é bacana
Via Guia do Estudante